As intervenções urbanas do Afrobapho mostram por que Salvador está fervendo
Neon, música, performance e referências afrofuturistas se unem nesse coletivo baiano que surgiu para levar às ruas intervenções urbanas que discutem raça, gênero e sexualidade
Alan Costa, Malayka SN, Ah Teodoro e Carolina Neves Lisboa queriam levar suas discussões políticas nas redes sociais a um novo espaço, mas acabaram encontrando além da amizade, uma forma de expressão cultural.
"Buscávamos uma linguagem para discutir coisas tão importantes, quanto ser negro, ser LGBT e mostrar como o racismo e a LGBTfobia afetam e agridem nossos corpos", explica Alan. "Fizemos ensaios fotográficos, de movimentos sociais e culturais, sobre ancestralidade, sobre o genocídio da juventude negra e viralizou. Recebemos um convite da Anistia Internacional para participar da campanha Jovem Negro Vivo."
Com o apoio da ONG, o Afrobapho ganhou visibilidade para expandir seus ensaios fotográficos coloridos e empoderadores. O primeiro sucesso veio com a versão de "Bixa Preta", da MC Linn da Quebrada, filmada nas ruas de uma favela baiana. "A gente encontrou uma forma diferente de falar sobre os nossos corpos. Começamos a fazer intervenções urbanas, a pensar na rua como uma outra forma de diálogo. Vamos pra rua disputar a cidade, mostrar que a gente não deve ficar isolado em nossos 'guetos'."
A referência da festa Batekoo, que também surgiu em Salvador, fomentou ainda mais o processo criativo e afinou o discurso do Afrobapho, que encontrou uma comunidade disposta a sair da marginalidade. "Criamos nossa festa como mecanismo de militância e a arte passou a ser um fio condutor."
Entre 2017 e 2018, o Afrobapho recebeu convites para participar do Bloco da Pabllo Vittar na Bahia, do festival Coquetel Molotov e para festas em São Paulo, com o Coletividade Namíbia, e no Rio de Janeiro.
"A partir desses convites surgiu a necessidade de criar um show para fazer um resumo do nosso ARTvismo. Usamos a dança para mostrar como nossos corpos dissidentes são poderosos. No início, trabalhávamos mais com artes visuais com drag queers, performers, que usavam a dublagem e a dramaticidade de uma forma mais artística e teatral", explica Alan. "Depois de algum tempo, incorporamos a dança em nossos eventos, motivados pelo sucesso do vídeo de 'Bixa Preta"', explica Alan.
Alan explica que o coletivo não queria apenas ser uma frente LGBT, mas também discutir padrões sociais. "A gente percebe que a cidade é de maioria negra, mas são pessoas negras sofrendo com sexualidade de gênero. A questão é que a heteronormatividade agride nossos corpos de alguma forma. A ideia é não comungar com o padrão, as pessoas que estão com a gente são bixas afeminadas, travestis, homens trans, usam salto, muita maquiagem."
As referências vão de Lacraia, Vera Verão ao clássico Paris Is Burning. "O afrofuturismo também é uma corrente cultural que a gente acredita. Nossos figurinos têm um mix e cores que reverberam para o futuro."
Com o trabalho no projeto Quilombox, uma série de oficinas criativas para falar de direitos humanos e fortalecer redes de jovens negros, o coletivo foi convidado por uma professora da Flórida para falar sobre a vivência deles no Brasil em uma conferência na Jamaica, onde ser gay ainda é considerado crime. Para isso, abriram um financiamento coletivo que tá rolando no Vakinha para arcar com custos de hospedagem e passagens.
Alan acredita que as ações dos últimos três anos já iniciaram uma mudança de percepção nos eventos em que participam na cidade. "Já ouvimos que a gente era uma vergonha para a comunidade gay e hoje as pessoas estão mais aptas a entender porque utilizamos essas narrativas. A rua é um espaço de risco e precisamos ocupá-las".
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